Propaganda e genocídio: serão os propagandistas russos punidos?

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Os juristas ucranianos e internacionais dos direitos humanos documentam diariamente os crimes de guerra cometidos pelos militares russos na Ucrânia. Fala-se muito do genocídio dos ucranianos, da criação de um tribunal internacional para Putin e os seus acólitos, e mencionam-se os julgamentos de Nuremberga e outros exemplos de punição de criminosos de guerra. Mas será que são realmente eficazes e será que os ucranianos podem esperar que, mais cedo ou mais tarde, seja criado um tribunal para os participantes na propaganda russa? Utilizando exemplos históricos e paralelos com o presente, analisaremos os casos de propagandistas em tribunais internacionais e descobriremos onde procurar justiça nesta matéria.

Todas as guerras de agressão são conduzidas utilizando a propaganda como instrumento para influenciar as massas, porque a destruição de toda uma nação ou comunidade nacional exige planeamento, coesão e motivação. Assim, a propaganda torna-se, por assim dizer, o combustível invisível das guerras, e também um disfarce aceitável para os seus crimes.

Responsabilidade pelo genocídio

O artigo III da Convenção das Nações Unidas para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio (1948) condena não só a prática de assassínios em massa, mas também a conspiração para cometer genocídio e o incitamento direto e público à sua prática. Por conseguinte, os propagandistas podem ser punidos ao abrigo do direito internacional. A dificuldade reside em provar a sua culpa. Afinal de contas, os vestígios do crime são frequentemente destruídos e as vítimas nem sempre procuram ajuda do sistema judicial por receio de serem retraumatizadas ou estigmatizadas na sociedade, ou devido à crença generalizada de que tais casos são uma expressão natural da guerra. Muitos crimes ou permanecem desconhecidos ou são revelados muito mais tarde.

Comecemos pelo conceito de genocídio, para perceber como é formada a base de provas para punir as pessoas envolvidas na sua organização e execução. Azeem Ibrahim, diretor de iniciativas especiais do centro analítico norte-americano “New Lines Institute for Strategy and Policy” (Instituto de Estratégia e Política “Novas Linhas”), que investiga o genocídio e a guerra russa contra a Ucrânia, alerta para a necessidade de não se interpretar mal o conceito de genocídio:

— As pessoas pensam que o genocídio tem a ver com o número de pessoas que foram mortas. Mas não tem nada a ver com números. Tem a ver com a intenção.

O contexto histórico ajuda a determinar esta intenção, a fim de provar o facto do genocídio e punir os seus responsáveis. No entanto, os porta-vozes desta intenção – os propagandistas – são muito raramente responsabilizados criminalmente. É muito difícil provar a sua participação na criação de conteúdos de propaganda durante a guerra, e é ainda mais difícil ligar o que disseram ao genocídio e às suas consequências. Além disso, tais acusações são acompanhadas de uma violação do direito à liberdade de expressão, garantido pela Declaração Universal dos Direitos do Homem (artigos 18.º e 19.º). Isto foi utilizado como argumento durante os julgamentos de propagandistas após o genocídio no Ruanda (África Central, 1994) e é suscetível de ser utilizado para defender os russos que são promotores de uma guerra em grande escala na Ucrânia.

Seria um caminho errado comparar tragédias como o Holocausto durante a Segunda Guerra Mundial e os massacres de ucranianos durante a guerra em grande escala que a Rússia lançou em fevereiro de 2022. Afinal, cada genocídio é um fenómeno excecional, baseado numa política de longo prazo, por vezes secular, de discriminação, isolamento e restrição dos direitos de um determinado povo ou grupo populacional. O contexto histórico, que é utilizado e manipulado com sucesso por tiranos e criminosos para os seus próprios fins, pode tornar-se um pré-requisito para o extermínio planeado de um determinado grupo de pessoas.

Genocídio no Ruanda
O genocídio de 1994 no Ruanda foi um massacre do povo Tutsi organizado pelo povo Hutu que era a maioria étnica no país. A ONU estima que mais de um milhão de pessoas foram mortas e que cerca de 150.000 a 250.000 mulheres foram violadas.

A guerra russo-ucraniana é um caso em que a Rússia está a exterminar deliberada e sistematicamente a população da Ucrânia. No caso do Ruanda, tratou-se de uma guerra interna entre dois povos (Hutus e Tutsis), já o genocídio no Camboja (1975-1979) foi o extermínio de pessoas devido às suas opiniões políticas. Cada um destes genocídios tem condições prévias que formaram uma intenção específica. Cada um deles é uma tragédia, mas é errado, do ponto de vista jurídico ou filosófico, medir estas tragédias.

Muitos políticos ucranianos e internacionais falam em punir os russos por crimes de guerra ou mesmo por genocídio durante uma guerra em grande escala. Numa conversa com Jonah Diamond, o advogado canadiano cuja especialidade é a defesa dos direitos humanos, do Centro Raoul Wallenberg para os Direitos Humanos, ficou claro que era necessária uma abordagem diferente:

— Na Ucrânia, existem atualmente (no final de janeiro de 2023 – ed.) mais de 60 mil investigações de crimes de guerra. Este número é tão elevado que perde qualquer forma real de resposta ou de prevenção efetiva de novos crimes e de proteção da população. Concentrar-se apenas nos crimes de guerra, nos criminosos de guerra e na sua perseguição é, de facto, errado, porque, historicamente, os julgamentos de criminosos de guerra não têm sido assim tão eficazes.

Tony Judt, um historiador britânico-americano, também fala sobre este assunto no seu livro “Pós-guerra. História da Europa desde 1945″. Por exemplo, na Itália do pós-guerra, não era claro quem deveria ser levado à justiça e por quê (o país era membro das potências do Eixo). A Áustria, que foi reconhecida no Pacto dos Aliados de 1943 como a “primeira vítima” da Alemanha hitleriana, quase se safou dos crimes de guerra porque “os austríacos simplesmente esqueceram a sua ligação a Hitler” e “a adaptação do passado recente em seu próprio benefício convinha a todas as forças locais”. Na Grécia, “as purgas e os julgamentos <…> foram abertamente motivados por razões políticas”, tal como noutros países da Europa Ocidental. O governo comunista da URSS utilizou os processos como um instrumento para eliminar os obstáculos que se lhe opunham. Assim, a história revela vários tristes paradoxos: em primeiro lugar, é difícil separar o branco do preto durante uma guerra, pelo que, quando todo o país é mergulhado nestes acontecimentos, os juízes muitas vezes não são melhores do que os arguidos; em segundo lugar, os países esgotados pela guerra procuram restaurar pelo menos alguma estabilidade e, por isso, muitas vezes (conscientemente ou não) são forçados a fazer compromissos que não teriam sido aceitáveis durante o confronto; em terceiro lugar, os principais autores de crimes conseguem frequentemente evitar a responsabilidade, enquanto as pessoas comuns (muitas vezes não envolvidas) não o conseguem.

Será a Ucrânia capaz de punir todos os autores dos mais de 60.000 crimes de guerra registados, especialmente tendo em conta que a guerra em grande escala ainda está em curso? Poderemos provar a ligação entre o conteúdo dos propagandistas (textos, áudio, vídeo, etc.) e os seus crimes reais? E será que os tribunais internacionais devem ser considerados a única forma de punir os propagandistas?

Potências do Eixo
Uma aliança entre a Alemanha, a Itália e o Japão que assinou o Pacto Triplo em 1940. Os países concordaram em ajudar-se mutuamente em caso de ataque de outros Estados. Cinco outros países europeus juntaram-se à aliança do Eixo durante a Segunda Guerra Mundial (Hungria, Roménia, Bulgária, Eslováquia e Croácia).

A propaganda no contexto da guerra e do genocídio

Embora a influência da propaganda nas guerras mundiais e nos genocídios seja inegável, muitas vezes não é vista como a causa principal desses acontecimentos horríveis. No entanto, não são apenas os cartazes com slogans e os discursos dos detentores do poder que têm impacto, uma vez que as narrativas de propaganda são captadas pelas massas e as pessoas dizem as mesmas palavras em conversas privadas ou em público. Desta forma, as percepções distorcidas e tendenciosas dos acontecimentos tornam-se invisíveis e, portanto, impunes. É a natureza sistemática e leal da propaganda que é fundamental para compreender a sua relação direta com os crimes de guerra, invasões e a repressão em massa.

Consideremos como exemplo a propaganda moderna na Rússia. Os discursos dos porta-vozes do Kremlin na televisão russa não são o princípio e o fim deste fenómeno, porque se baseia em métodos sistemáticos de influência da consciência e da percepção. A propaganda baseia-se sempre em algo e, ao mesmo tempo, “infecta” várias esferas da vida pública. No caso da Federação Russa, estes pontos-chave de apoio e influência são uma longa história colonial, a ideologização da educação (especialmente quando se trata do papel da Ucrânia e de outros povos e nacionalidades usurpados pela Rússia), a opressão social e económica geral de certas regiões e os meios de comunicação social, que durante a presidência de Putin se tornaram um instrumento para a “zombificação” em massa dos russos e para a criação de uma realidade informativa alternativa e distorcida. As grandes injeções de fundos para “aquecer” e apoiar esta propaganda fora do país são também um fator importante para o seu sucesso. Graças às tecnologias de “força suave”, a propaganda russa funciona mesmo em países democráticos. Para implementar um sistema deste tipo, é necessária a coesão de muitas pessoas — desde profissionais dos meios de comunicação social a professores e académicos, bem como pessoas comuns que optam por acreditar nesta propaganda. Optam, porque os russos ainda têm acesso a outras informações, ao contrário, por exemplo, da população de Myanmar (Ásia) ou mesmo da China, onde as redes sociais e os meios de comunicação social foram completamente controlados pelas autoridades ou proibidos durante muitos anos.

A guerra de ocupação e o genocídio só são possíveis quando as pessoas apoiam maciçamente este sistema de destruição.

Por exemplo, os propagandistas russos modernos apoiam uma teoria da conspiração sobre os judeus-maçons.

A mando da polícia secreta russa no início do século XX, foram criados os chamados “Protocolos dos Sábios de Sião”, materiais de propaganda inventados. Alegadamente, provam a existência de uma irmandade de maçons-judeus que secretamente governam o mundo. A falsificação foi produzida para transferir a responsabilidade dos problemas sociais da Rússia para as comunidades judaicas que aí viviam, ou seja, era uma forma de incitar à hostilidade. Embora se tenha provado que os textos são falsos, os propagandistas russos modernos continuam a apelar a esta tese. Outra ideia que estão a propagar é a de “sorosiata” (teorias de conspiração à volta de George Soros – ed.), que mistura facilmente o ódio aos judeus, aos ucranianos e ao mundo ocidental como um todo. No caso da propaganda antiucraniana que a Rússia lançou em 2014, quando invadiu o leste da Ucrânia, uma lógica semelhante pode ser traçada, em particular, ao “nazismo”. Os porta-vozes do Kremlin estão constantemente a inventar novas “embalagens” para essa retórica: desde a desinformação sobre a unidade separada das forças especiais Azov até às falsificações sobre a pulseira do Comandante Supremo das Forças Armadas da Ucrânia, Valeriy Zaluzhnyi, com símbolos nazis. Outro exemplo é a acusação de “nazismo” contra os militares ucranianos: em 21 de fevereiro de 2023, Putin discursou na Assembleia Federal e mostrou-se indignado com o facto de as Forças Armadas da Ucrânia terem mudado o nome de uma das suas brigadas para Edelweiss, uma vez que uma unidade com o mesmo nome existiu na Alemanha nazi e esteve envolvida numa série de crimes de guerra. No entanto, um esquadrão de montanha com o mesmo nome existiu na Guarda Nacional da Rússia, até há pouco tempo.

Sorosiata ou sorosinhos
Vem do nome de George Soros, um financeiro e filantropo americano de ascendência húngaro-judaica que fundou dezenas de fundações destinadas a ajudar a construir as infraestruturas e as instituições de uma sociedade democrática aberta. O termo "sorosiata" foi utilizado pela primeira vez pelo russo Yuri Polyakov para caracterizar a visão do mundo ocidental.

Os genocídios no Camboja e no Ruanda foram erradamente vistos pela comunidade internacional como mais um caos nos países menos desenvolvidos, onde prevalece a desordem interna, se não mesmo a anarquia. No entanto, o genocídio só é possível se houver um sistema, uma ordem e um controlo rigoroso sobre a criação e a difusão de narrativas ideológicas fundamentais.
O genocídio na Indonésia (1965-1966), durante o qual mataram meio milhão de pessoas, foi também influenciado pela propaganda sistémica. Após um golpe militar em Jacarta e a tomada do poder, o general indonésio Suharto e o seu governo iniciaram um massacre da oposição, matando membros e apoiantes do Partido Comunista. Esta ação foi facilitada pela campanha anticomunista dos países ocidentais, que o general Suharto utilizou com êxito para os seus próprios fins — nas suas mãos, tornou-se um apelo à morte. Os apoiantes do general estavam prontos para matar os seus vizinhos por suspeitas (muitas vezes falsas) de apoiarem o Partido Comunista.

O mundo vivia a realidade da Guerra Fria, quando o comunismo continuava a espalhar-se rapidamente pelo mundo, mas, nessa altura, muitos países da América Latina e da Ásia ainda não se tinham apercebido de que as ideias comunistas de Karl Marx, distorcidas por Vladimir Lenine, não eram a melhor alternativa ao nazismo.

O Departamento de Pesquisa e Informação (The Information Research Department, IRD, em inglês), criado pelo governo trabalhista britânico em 1945, tentou impedir a instauração de um regime comunista no quarto país mais populoso do mundo. A equipa do IRD criou materiais anticomunistas e, em geral, as suas atividades estavam estreitamente ligadas aos serviços secretos de inteligência britânicos MI-6.

Os investigadores de genocídio da Universidade Yale explicam:

— A maior parte das vítimas eram camponeses javaneses (geralmente muçulmanos) e camponeses hindus balineses que também apoiavam ou eram suspeitos de apoiar o PKI (Partai Kommunis Indonesia, Partido Comunista da Indonésia – ed.). Tanto em Java como em Bali, o PKI obteve muitos votos nas eleições de 1950. O exército empreendeu uma campanha anticomunista, enquanto grupos fervorosos de jovens muçulmanos levaram a cabo a maior parte dos assassinatos.

Após os massacres de 1965-1966, Suharto tornou-se o líder autoritário da Indonésia, tendo governado o país durante 32 anos, até que os protestos em massa o obrigaram a demitir-se. O país ainda está a sofrer as consequências devastadoras do seu regime.

É inegável o caráter planeado e sistemático da propaganda na URSS. As deportações e os assassínios em massa, as repressões, a russificação forçada e os genocídios de certos povos foram sempre acompanhados de campanhas de propaganda. Todas estas atividades de informação são semelhantes às do Ruanda, da Indonésia, do Camboja e de outros países com períodos totalitários.

Acusar falsamente os “dissidentes”, criar um sentimento de ameaça e promover a obediência como a única forma correta de evitar a ameaça (na realidade, isto significava muitas vezes a submissão ao agressor, tanto física como mental), era isto que todos os governos totalitários e os seus propagandistas praticavam.

A propaganda serve sempre vários objetivos. Em primeiro lugar, justifica os crimes do país agressor aos olhos do seu povo, heroificando os assassinos como “libertadores” ou como combatentes de uma missão “superior”. Em segundo lugar, ajuda a distorcer a história e, assim, por um lado, a limpar os vestígios dos crimes para que seja difícil ou impossível encontrar os seus autores no futuro e, por outro lado, a ter uma fundamentação para novas intervenções culturais ou militares.

Por exemplo, a deportação dos tártaros da Crimeia em 1944 foi acompanhada de falsa propaganda sobre a sua colaboração em massa com os nazis. Os soviéticos espalharam a ideia de que os tártaros da Crimeia tinham cometido “atos de traição” e que, por isso, constituíam uma ameaça para os outros cidadãos soviéticos.

Não devemos subestimar a propaganda russa moderna durante uma guerra em grande escala, porque, apesar do seu absurdo, continua a alimentar a mesma ideia-chave: a guerra não cria sofrimentos, alivia-os.

“A máquina militar da NATO está a aproximar-se das nossas fronteiras”, disse Putin num discurso em 24 de fevereiro de 2022. Um dos convidados do programa de Vladimir Solovyov declarou: “A Ucrânia não pode ser reparada. Não se pode reparar esta estrutura, tem de ser destruída porque é antirrussa. É uma entidade que ameaça a Rússia”.

A ameaça ilusória colocada pelo Ocidente coletivo e pela Ucrânia é a tese unificadora de todo o povo russo e dos seus líderes. Está tão enraizada na sua consciência que é quase impossível de ser refutada.

Aqueles que difundiram propaganda na Indonésia, no Camboja e na URSS nunca foram punidos, e muito menos aqueles que a implementaram em crimes reais. No entanto, há casos na história em que os propagandistas foram levados à justiça em tribunais internacionais e locais. Estes precedentes são frequentemente utilizados como exemplo para futuros julgamentos de criminosos russos. Vejamos qual destes casos é efetivamente relevante para a atual guerra russo-ucraniana e que outros métodos de combate aos propagandistas existem.

Genocídio no Ruanda. Como foram punidos os propagandistas

Em 2022, teve início em Haia (Países Baixos) o julgamento do propagandista ruandês Félicien Kabuga, de 89 anos. Após 26 anos de esconderijo em diferentes países, foi finalmente apanhado em Paris, em 2020. O suspeito é acusado de incitar ao genocídio, financiar meios de propaganda, grupos armados e organizações políticas responsáveis pelo genocídio de 1994 no Ruanda, que foi um dos mais brutais da história da humanidade.

O genocídio tinha por objetivo exterminar uma das etnias do Ruanda, os tutsi. Foi levado a cabo por unidades armadas do governo provisório. Mas as vítimas incluíam também representantes do povo hutu que apoiavam os tutsis de alguma forma. Os propagandistas contribuíram para o extermínio em massa do povo tutsi.

Félicien Kabuga era o proprietário da RTLM (acrónimo de “Rádio e Televisão Livre das Mil Colinas”), que funcionava como fonte de propaganda, incitando ao ódio e à violência. A RTLM desumanizava os tutsis através dos seus conteúdos, chamando-lhes “baratas” e apelando ao seu assassínio, muitas vezes através de linguagem metafórica: “cortem as árvores altas!” (acreditava-se que os tutsis, ao contrário dos hutus, eram altos), “exterminem as baratas!”. Os apresentadores da RTLM liam em direto listas de “pessoas potencialmente perigosas”, indicavam os endereços das futuras vítimas e facilitavam o assassínio em massa organizado de tutsis, no qual também participavam cidadãos comuns. A arma utilizada para o crime foi sobretudo uma arma branca, nomeadamente um machete, que deu origem ao nome alternativo de RTLM – “Rádio Machete”.

Considera-se geralmente que o genocídio teve início com o abate de um avião que transportava o Presidente do Ruanda, Juvénal Habyarimana, e o Presidente do Burundi, Cyprien Ntaryamira, em abril de 1994. Ainda não existe um parecer oficial sobre a responsabilidade por esta tragédia e a investigação está em curso. No entanto, os preparativos para o genocídio tinham começado muito antes e ganhavam novas dimensões todos os anos, nomeadamente através da propaganda. Depois dos massacres no Burundi, país vizinho do Ruanda, em 1993, os propagandistas lançaram campanhas intensas culpando os tutsis em tudo (embora, na realidade, cerca de 50.000 hutus e tutsis tenham sido mortos no Burundi). No seu livro “Justiça na relva: três jornalistas ruandeses, o julgamento dos seus crimes de guerra, e a procura de redenção de uma nação”, a escritora americana de origem belga Dina Temple-Raston regista a mudança de retórica do então presidente do Ruanda em relação aos tutsis:
— Em primeiro lugar, mudou o vocabulário. Apelou à experiência do período colonial. Quando foi eleito pela primeira vez, Habyarimana (então presidente do Ruanda – ed.) falou dos tutsis como um grupo étnico, não como uma raça. Eram ruandeses, disse ele, e não uma comunidade extraterrestre. Após os assassínios no Burundi, o mantra mudou. Passou a ser a convicção de que, mesmo nas suas ações mais legítimas e quotidianas, os tutsis estavam a invadir o território de outra pessoa.

Durante um julgamento de grande destaque em 2003, por incitamento ao genocídio, foram condenados propagandistas ruandeses. Entre eles encontravam-se Ferdinand Nahimana, um dos fundadores da RTLM (prisão perpétua), Hassan Ngeze, proprietário e editor do jornal extremista hutu Kangura (prisão perpétua), e Jean-Bosco Barayagwiza, um dos principais executivos da RTLM que boicotou o julgamento (pena de 35 anos, reduzida para 27 anos pelo facto de ter cumprido 7 anos da sua pena enquanto aguardava julgamento). Os três arguidos apresentaram recurso. Em 2007, a Câmara de Recursos anulou vários aspectos da decisão da primeira instância – para Nahimana e Ngeze, as sentenças foram reduzidas de prisão perpétua para 30 anos, e a pena de Barayagwiza foi reduzida em 3 anos.

Os julgamentos dos propagandistas ruandeses que ficaram na história como o “Caso dos Media” suscitaram um grande debate na comunidade internacional. Alguns consideraram-no um ataque à liberdade de expressão que, do ponto de vista do direito internacional, poderia enfraquecer a independência dos media. E todo o Tribunal Penal Internacional para o Ruanda foi alvo de críticas, incluindo do jornalista ruandês Martin Semukanya, por ineficiência, corrupção e qualidade questionável dos resultados:

— Quantas pessoas foram condenadas, em que grau e com que fundamento? Em quase 20 anos, foram julgadas menos de 70 pessoas. O Ruanda enquanto sociedade não aceita isto. Isto não é justiça. Penso que foi um grande fracasso.

“O caso dos media” mostra como os líderes do sistema de propaganda podem ser punidos ao abrigo do direito internacional. No entanto, este caso é irrelevante para a guerra em grande escala da Rússia contra a Ucrânia, porque no Ruanda os propagandistas estavam ligados aos líderes hutu, colaboraram com eles e, no caso de alguns, financiaram literalmente o assassínio em massa. Teriam recebido estas sentenças se tivessem sido julgados apenas por propaganda?

Outra questão é o que fazer com todos aqueles que estavam (conscientemente ou não) a conduzir a máquina de propaganda, mas não eram os seus líderes? Apresentadores de televisão e de rádio, operadores de câmara, realizadores, argumentistas, produtores, técnicos, editores, publicitários e outros – aqueles sem os quais nenhum meio de comunicação social teria tido um impacto tão grande.

Entre os propagandistas ruandeses contam-se também intelectuais ativos nos meios de comunicação social, com formação europeia, que usaram a sua posição e autoridade para incitar ao genocídio. Podemos presumir que os porta-vozes públicos e os intelectuais compreenderam as consequências das suas declarações. No entanto, é a interação entre o orador e o público que cria o campo mais vasto para interpretar a forma como as pessoas realmente percebem a informação.

O tribunal internacional dos propagandistas do Ruanda mostra que a lista de criminosos inclui, na sua maioria, apenas pessoas que são símbolos do “discurso de ódio”. Por conseguinte, é duvidoso que estes “parafusos” do sistema de propaganda russo venham a ser incluídos na lista de criminosos a nível internacional, mas ainda assim podem ser julgados. Por exemplo, um tribunal popular ruandês chamado Gacaca conseguiu condenar a apresentadora de rádio Valerie Bemeriki a prisão perpétua por incitamento ao genocídio, e o jornalista belga Georges Rouge a 12 anos (com uma pena comutada por cooperação com a investigação). No entanto, estes tribunais não eram profissionais, eram amadores e, frequentemente, não dispunham de provas reais da participação individual no genocídio. Ao mesmo tempo, os suspeitos foram detidos em condições desumanas durante anos ou mesmo décadas.

O Holocausto e a impunidade da propaganda

“Aqueles que nunca se esquecerão” (Those Who Will Never Forget) – esta nota foi encontrada com o corpo de Herberts Cukurs, um aviador letão e vice-comandante do Arajs Kommando, uma unidade policial auxiliar que levou a cabo os mais brutais massacres de judeus letões durante o Holocausto.

O recado foi deixado por agentes da Mossad, a agência de inteligência israelita, quando eliminaram este criminoso no Uruguai, em 1965, depois de o terem atraído para lá com o pretexto de estabelecerem um negócio conjunto. De acordo com Michael Bar-Zohar, no seu livro “Mossad: as maiores operações dos serviços secretos israelitas”, alguns altos funcionários na Alemanha receberam a mesma mensagem. Este é um exemplo de como uma comunidade que sofreu com a crueldade do seu governo ou ocupantes no passado acaba por decidir não esperar durante anos pela justiça oficial (muitas vezes, infelizmente, duvidosa) e recorre a investigações independentes.

Com o passar da história, pode parecer que a punição dos nazis era um processo previsível que não foi entravado. Nuremberga e, mais tarde, o julgamento (1945) de um dos líderes nazis, Adolf Eichmann, tornaram-se símbolos da realização de, pelo menos, alguma justiça. A propósito, este último também foi apanhado por agentes da Mossad.

No entanto, os julgamentos de Nuremberga foram mais uma condenação demonstrativa das atuações dos nazis. Os representantes da coligação anti-Hitler (Reino Unido, Estados Unidos, França e dezenas de outros países que criaram as Nações Unidas) selecionaram 24 arguidos que representavam as autoridades do Terceiro Reich e outros 6 que representavam instituições militares, governamentais e administrativas centrais. Como resultado, 3 das 6 organizações foram consideradas criminosas, mas isso não significa que todos os membros dessas instituições tenham sido punidos. Mesmo com os crimes aparentemente óbvios dos nazis, os defensores dos direitos humanos tiveram de utilizar numerosas provas, testemunhos, documentários e fotografias. São histórias de vítimas contadas diretamente na cara dos seus carrascos, uma papelada interminável que nem sempre garantia uma condenação.

A comunidade internacional não pretendia processar todos os criminosos nazis; afinal, era difícil estabelecer a ordem anterior à guerra, incluindo o Estado de direito, no mundo do pós-guerra. No seu livro “Pós-guerra”, o historiador Tony Judt destrói a visão idealizada que os seus contemporâneos tinham dos julgamentos de Nuremberga: “Havia demasiados nazis e os argumentos contra as sentenças coletivas eram muito convincentes. Em todo o caso, ninguém saberia o que fazer com uma decisão judicial sobre a culpa semelhante de muitos milhões de pessoas”. Uma outra observação de Judt é importante:

— O facto de a culpa pessoal dos líderes do Terceiro Reich, a começar pelo próprio Hitler, ter sido estabelecida de forma tão completa e meticulosa levou muitos alemães a acreditarem que os restantes não tinham culpa, que o povo alemão, no seu conjunto, era tão vítima passiva do nazismo como todos os outros.

Já podemos ver esta atitude na Rússia, onde tudo se resume às teses “nós somos pela paz” e “esta é a guerra de Putin”.
Com a execução de Adolf Eichmann, a Alemanha iniciou, já na década de 1960, o debate sobre a limitação do prazo de prescrição dos crimes nazis. Quando alguns procuradores, políticos, jornalistas e sobreviventes do Holocausto tiveram de insistir na continuação dos julgamentos de crimes de guerra, tornou-se claro que até a comunidade ocidental tinha subestimado a dimensão do genocídio do povo judeu.

“Aqueles que nunca esquecerão”, ou seja, os judeus e Israel como um Estado recém-independente, foram quase os únicos que continuaram a perseguir, encontrar e punir os criminosos da Alemanha nazi. Muitos dos que perderam as suas famílias em câmaras de gás ou em fuzilamentos em massa dedicaram toda a sua vida a “caçar” os nazis. E se não fossem as suas ações e o facto de lembrarem à comunidade internacional que não iriam parar, apesar das leis aprovadas, quem sabe se Herberts Cukurs e os restantes criminosos detidos após os julgamentos de Nuremberga teriam sido punidos.

Permanece incerto o número de nazis que fugiram para a América Latina, o Médio Oriente ou o Norte de África, ou que permaneceram na Alemanha e noutros países europeus, mudando as suas convicções políticas ou simplesmente evitando qualquer punição. Entre eles, há um grande número de propagandistas nazis (o seu núcleo era a comunidade intelectual alemã da época) que, por uma infeliz coincidência, foram ignorados ou cuja culpa não pôde ser provada devido à burocracia e complexidade dos julgamentos.

Após a derrota do nazismo, os membros do sistema judicial do Terceiro Reich conseguiram construir carreiras de sucesso já na Alemanha do pós-guerra. Depois de 1949, os antigos nazis fizeram tudo para impedir o julgamento dos criminosos nazis, como afirma Manfred Hertemaker, professor de História Moderna na Universidade de Potsdam: “Depois de 1949, nem um único juiz ou procurador foi responsabilizado pelas suas ações durante o Terceiro Reich”.

Quando os especialistas falam sobre os futuros julgamentos de criminosos de guerra russos, citam frequentemente o exemplo do propagandista nazi Julius Streicher, editor do jornal de propaganda Der Stürmer (em alemão, “O Tempestuoso”) e seguidor fanático de Adolf Hitler, que foi executado nos julgamentos de Nuremberga. No entanto, é preciso não esquecer que Julius Streicher não era apenas um propagandista, mas também uma figura política.

Nos mesmos julgamentos, Hans Fritzsche, chefe do departamento de radiodifusão do Ministério da Propaganda e da Educação Pública do Terceiro Reich, que transmitia quase diariamente horríveis discursos antissemitas, foi considerado inocente de crimes de guerra e de crimes contra a humanidade. Em 1946, o escritor alemão de origem judaica Victor Klemperer escreveu:

— Quando a guerra na Europa terminou, em maio de 1945, os Aliados enfrentaram a difícil tarefa de reformar a sociedade alemã e reeducar a sua população após doze anos de domínio nazi e de uma dieta constante de propaganda de ódio.

O nazismo penetrou na carne e no sangue do povo através de palavras isoladas, expressões idiomáticas e estruturas de frases que lhe foram impostas em milhões de repetições e aceites de forma mecânica e inconsciente.
O nazismo penetrou na carne e no sangue do povo através de palavras isoladas, expressões idiomáticas e estruturas de frases que lhe foram impostas em milhões de repetições e aceites de forma mecânica e inconsciente.

Isto prova como a propaganda funciona de forma subtil e discreta a favor dos países invasores, em especial quando estes cometem genocídios. No entanto, a prática dos julgamentos dos nazis no pós-guerra é imperfeita e limitada: o direito internacional não dispõe de instrumentos para punir todos os envolvidos em assassínios em massa, especialmente quando se trata da cumplicidade de cidadãos de todo o país ou da participação baseada apenas na ideologia. No entanto, as atividades do recém-criado Estado de Israel para punir os autores dos crimes mostram claramente quem terá de lutar pela justiça até ao fim: o próprio povo, que sofreu com os ocupantes.

A propaganda russa atual e a punição dos culpados

A guerra dos russos contra a Ucrânia está a decorrer à vista do mundo e está a ser seguida nas redes sociais quase em direto, com base nas palavras e experiências dos seus participantes e testemunhas oculares, e não em memórias. A propaganda russa tornou-se uma das principais narrativas para desacreditar a Rússia e continuar a exercer pressão sobre o país agressor. Vladimir Solovyov, Margarita Simonyan, Olga Skabeeva, Yevgeny Popov, Anton Krasovsky, Dmitry Kiselev – estes nomes são conhecidos em todo o mundo, porque se tornaram os porta-vozes do Kremlin. Estas são figuras-chave dos meios de comunicação social cujas atividades ilustram a forma como a informação se torna uma arma contra a Ucrânia.

Por exemplo, um bem conhecido artigo publicado nos meios de comunicação social estatais russos “RIA Novosti” por Timofey Sergeitsev, em abril de 2022, intitulado “O que a Rússia deve fazer à Ucrânia”, não foi uma revelação para os ucranianos, mas abalou o mundo como prova de um apelo incondicional ao genocídio. Apenas algumas citações: “não precisamos de uma Ucrânia nazi, banderista (Stepan Bandera foi um político ultranacionalista ucraniano – ed.), inimiga da Rússia e instrumento do Ocidente para a destruição da Rússia”, “o nome ‘Ucrânia’ não pode, aparentemente, ser mantido como título de uma entidade estatal totalmente desnazificada no território libertado do regime nazi”, “a desnazificação será inevitavelmente também uma desucranização”.

No seu artigo para o The Guardian, o intelectual britânico de ascendência ucraniana Peter Pomerantsev discute o tema da punição dos propagandistas e sublinha:

— A teoria militar russa considera as operações de informação como parte integrante das operações militares a uma escala sem precedentes – os executivos dos media estatais russos receberam mesmo medalhas militares pelo seu papel durante a anexação (ocupação – ed.) da Crimeia em 2014.

Quando falamos em punir os propagandistas, não devemos pensar exclusivamente em termos de tribunais internacionais, tal como não devemos esperar pelo fim da guerra para começar a punir os culpados. Temos de compreender que a maior parte deles nunca será punida a nível jurídico internacional. Afinal de contas, para além dos mundialmente famosos “cabeças de informação” russos do Kremlin, há muitos outros, muitas vezes não famosos, desconhecidos (por vezes, nem sequer russos).

Por exemplo:
— empregados de canais de televisão, rádio, imprensa escrita e meios de comunicação social digital envolvidos na criação de conteúdos de propaganda, mas que não são os rostos dos seus meios de comunicação social, incluindo jornalistas estrangeiros que negam a existência da Ucrânia (p.ex., o antigo apresentador do canal Fox News, Tucker Carlson);
— organizadores, patrocinadores e trabalhadores de “exploração de botes”;
— educadores que apoiam a propaganda na Federação da Rússia e a difundem nos territórios temporariamente ocupados (reeducação ideológica das crianças);
— figuras da cultura e representantes do mundo do entretenimento;
— intelectuais ativos nos meios de comunicação social.

Uma exploração de botes é um grupo de pessoas que criam um certo espaço informativo a troco de dinheiro: criam páginas falsas, escrevem comentários, participam em discussões com os utilizadores das redes sociais e divulgam as narrativas que o seu cliente encomenda

No entanto, para além dos tribunais internacionais, existem outros métodos para desativar a máquina de propaganda e impedir que os indivíduos continuem as suas atividades criminosas.

1. Privar os propagandistas de uma plataforma de difusão

“Nunca existe uma boa ocasião para ficar calado” – esta é uma frase dita pelo intelectual e jornalista britânico-americano Christopher Hitchens quando explicava o papel dos escritores na política, nomeadamente quando em 1985, durante uma delegação de escritores à Turquia, os autores Arthur Miller e Harold Pinter criticaram o embaixador americano por não prestar atenção suficiente à situação das comunidades nacionais, nomeadamente à violação dos direitos dos curdos e à forma como as autoridades turcas prosseguiam uma “política quase genocida” em relação a eles (como o próprio Hitchens lhe chama).

Para que se faça justiça, todos os ucranianos e a comunidade internacional devem seguir um princípio semelhante: criticar as organizações que equiparam russos e ucranianos, que convidam oficialmente russos para eventos e prémios internacionais, que deixam participar a Rússia no Conselho de Segurança da ONU e noutras organizações internacionais, etc.

Estes casos devem atrair a máxima atenção no espaço informativo: dar entrevistas, envolver líderes de opinião e jornalistas, e comunicar clara e razoavelmente a sua posição nos meios de comunicação social e nas suas redes sociais. Desta forma, as teses dos propagandistas “afundar-se-ão” e tornar-se-ão menos pesadas e visíveis, nomeadamente nos resultados do Google. Esta é uma das formas mais eficazes de ajudar a Ucrânia na frente da informação.

Um bom exemplo é o pedido dos ucranianos para cancelar as discursos dos meios de comunicação social estrangeiros pró-russos na conferência internacional de tecnologia Web Summit 2022, em Lisboa – o editor Max Blumenthal e o jornalista Aaron Mate do website americano “The Grayzone”, bem como o americano Noam Chomsky. A participação dos dois primeiros foi completamente cancelada (nem sequer foram autorizados a ser convidados do evento), enquanto Noam Chomsky falou apenas online. Na véspera da conferência, equipas de “Detector Media” e “Molfar” investigaram o envolvimento de “The Grayzone” na difusão de propaganda russa.

2. Combater no ciberespaço

A Internet é o melhor meio para difundir propaganda, incluindo propaganda russa. As explorações de botes nas redes sociais e em sites de meios de comunicação social estrangeiros que acusam os ucranianos de serem nazis, que os ucranianos alegadamente “bombardearam o Donbas” e que estão agora a destruir as suas próprias cidades são o resultado de regras cibernéticas que não estão adaptadas aos efeitos da propaganda. Os ataques a meios de comunicação social e líderes de opinião ucranianos que ajudam a limitar o alcance ou a bloquear completamente as páginas das redes sociais, ainda não foram corrigidos pelas empresas tecnológicas internacionais e não são discutidos publicamente.

A Ucrânia está a defender-se não só no campo de batalha real, mas também no domínio da informação, pelo que o trabalho dos especialistas em tecnologias da informação e ciberguerra é crucial. Tanto profissionais como utilizadores comuns unem-se para combater os propagandistas.

Existem muitas instituições e associações que se dedicam à cibersegurança e ajudam a operar no ambiente online. Por exemplo, o exército informático ucraniano que efetua ataques DDoS contra instituições governamentais e empresariais russas e obtém acesso a informações de grandes empresas que patrocinam a guerra, como a Gazprom. A ciberpolícia está à procura de cibercriminosos e descobre explorações de botes geridos pela Federação Russa. Existem também grupos de utilizadores nas redes sociais, por exemplo, os Nafo Fellas com cães nos seus avatares do X (Twitter) que contrariam a propaganda russa.

Ataques DDoS
Ataques a um sistema informático de computador, para tornar os recursos informáticos indisponíveis para os utilizadores. Os métodos incluem sobrecarregar o sistema com pedidos, muitas vezes sem sentido ou confusos, e infetar com programas.

3. Reforçar as sanções contra a Rússia e investigar os crimes concretos

Uma das formas de retirar recursos aos propagandistas é através de sanções individuais que não foram totalmente aplicadas em mais de um ano de guerra em grande escala. A UE adicionou recentemente à sua lista de sanções (desde 16 de dezembro de 2022, inclui 1412 russos) aqueles que participaram na deportação forçada de crianças ucranianas. Os EUA, o Canadá e a UE já adicionaram um grande número de meios de comunicação social russos, os seus dirigentes e porta-vozes à lista de sanções. No entanto, as sanções contra organizações inteiras ou os seus dirigentes não se aplicam aos seus empregados.

As investigações sobre este tema são importantes: quem exatamente e como está envolvido na criação de propaganda nas diferentes fases de produção e na sua promoção? A investigação da Toronto TV que fornece nomes e moradas específicas de funcionários da fábrica de mísseis que matam ucranianos é um bom exemplo de tais investigações, pois ajuda a mostrar que não só Putin, mas todos os russos são culpados pela guerra em grande escala.

Izolyatsia
Uma antiga fábrica de materiais de isolamento em Donetsk. A partir de 2010, foi utilizada como plataforma de arte e exposições. Em 2014, a fábrica foi tomada por militantes da chamada República Popular de Donetsk e convertida numa câmara de tortura.

Se tiver informações sobre autores de crimes concretos, pode contactar o Fundo de Iniciativa de Justiça (JIF), fundado pelo jornalista Stanislav Aseyev, que passou 2 anos e meio no campo de concentração de Donetsk “Izolyatsia”. Em 2022, fundou uma organização sem fins lucrativos que realiza investigações jornalísticas sobre os crimes de guerra russos na Ucrânia. A fundação criou um website com informações sobre criminosos de guerra concretos que já foram alvo de suspeitas por parte das autoridades policiais ucranianas, organizações internacionais, etc. Oferece recompensas financeiras por informações valiosas sobre os autores dos crimes.

Uma componente importante da resistência informativa ao país agressor e do apoio à Ucrânia é a recusa de consumir produtos russos, meios de comunicação social e produtos culturais (frequentemente imperialistas), uma vez que isso não só ajuda diretamente a alimentar a economia russa, como também legitima a guerra, incluindo a propaganda. E, mais importante ainda, dar preferência às vozes, peritos e testemunhas oculares ucranianos e não apoiar a propaganda e o imperialismo russos, segundo os quais a Ucrânia e outros países vizinhos da Federação Russa não têm o direito de falar e, por conseguinte, de existir.

Material preparado por

Fundador do Ukraïner:

Bogdan Logvynenko

Autora,

Editora Chefe do Ukraïner Internacional:

Anasstacía Marushevska

Editora Chefe:

Anna Yablutchna

Editora:

Olésia Bogdan

Editor de foto:

Yurii Stefaniak

Tradutora:

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Editor de tradução:

Guilherme Calado

Gerente de conteúdo:

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Coordenadora de Ukraїner International:

Yulia Kozyryatska

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