Raízes ucranianas de pessoas famosas

Para além de informações sobre novos familiares, a investigação genealógica revela uma grande quantidade de informações interessantes sobre a história, a cultura e o modo de vida de diferentes épocas, ajudando assim a formar uma compreensão da própria identidade e da identidade do seu povo.

Falamos de figuras culturais mundialmente famosas de origem ucraniana.

Muitas pessoas famosas estão ansiosas por conhecer os seus antepassados e até fazem séries de documentários sobre o assunto. Por exemplo, a actriz britânica vencedora de um Óscar, Olivia Colman, viajou de Inglaterra para a Índia para saber mais sobre a sua trisavó. É nos episódios sobre ela que se pode ver como os arquivos da Índia estão bem preservados, apesar da política colonial de quase um século do Reino Unido.

Jack Palance e as suas origens ucranianas

A 18 de Fevereiro de 1919, no seio de uma família de imigrantes ucranianos, nasceu Volodymyr Palahniuk, e quando iniciou a sua carreira de actor, tornou-se Jack Palance. O vencedor de um Óscar, de um Globo de Ouro e de um Emmy orgulhava-se das suas origens: conhecia a língua e a história ucranianas, adorava cantar canções folclóricas e actuou na inauguração do monumento a Tarás Shevchenko em Washington DC (1964).

Visitou a Ucrânia várias vezes e esteve em Kyiv. Conversou com o realizador de cinema Yevhen Deslav sobre a possibilidade de interpretar o papel de Ivan Mazepa no seu filme. Jack Palance foi presidente do conselho de administração da Hollywood Trident Foundation, uma instituição de caridade que ajudou a estabelecer a cooperação entre representantes da indústria criativa que estavam a implementar vários projectos relacionados com a cultura e a história da Ucrânia. A Trident Foundation também trabalha em estreita colaboração com a Ukrainian Genocide Famine (Holodomor) Foundation, entrevistando sobreviventes destes horríveis acontecimentos.

Em Abril de 2004, Los Angeles acolheu o festival Russian Nights, sob o patrocínio do Presidente russo. O festival culminou com uma cerimónia solene em Hollywood em que artistas americanos (actores, artistas de teatro, músicos) de ascendência russa receberam o título de Artista Popular da Federação Russa.

“Sou ucraniano, não sou russo”, declarou Jack Palance, e recusou o título, dizendo: “…não tenho nada a ver com o cinema russo ou com a Rússia”. Depois disso, Jack Palance, juntamente com a sua mulher e o presidente da Fundação Tridente de Hollywood, Peter Borisov, abandonaram o evento.

É interessante que Peter Borisov tenha comentado mais tarde o discurso de Dustin Hoffman que também foi galardoado pela Federação Russa nessa noite. O actor americano agradeceu ao povo russo por ter derrotado a Alemanha nazi, salvando assim os seus avós, que “vieram de Kiev, que fica na Rússia”:

— Acho trágico que ele nem sequer conheça a história da sua própria família. A sua ignorância de factos fundamentais é chocante. O facto de [Dustin] Hoffman se expor, esperemos que sem querer, à difamação dos ucranianos e, portanto, de si próprio, ao apoiar um festival que exibiu o filme extremamente ofensivo e racista “72 Metros”.

O grande pianista e compositor de jazz Bill Evans nasceu em 1929 em Nova Jersey (EUA), filho de Harry e Mary Evans (nascida Maria Soroka). Evans recebeu 31 nomeações e 7 prémios Grammy e é considerado um dos músicos de jazz mais influentes da história.

A mãe de Bill escreveu que os seus pais falavam ucraniano e que o seu avô Ivan se auto-intitulava um Rusyn ou “cárpato-ros” da Halychyna/Galícia. A sua avó queria ensinar Billie a ler em ruténio, mas a sua mãe se opôs.

Estes casos de alienação das crianças em relação à sua verdadeira ascendência e cultura nacional levam a que nunca venham a saber que sangue corre efectivamente nas suas veias. Houve numerosos casos de emigrantes que negaram as suas origens ucranianas devido ao desejo de se assimilarem num novo país e à pressão da propaganda russa. Pouco se sabia sobre a existência da Ucrânia como país independente até ao colapso da URSS e, mesmo nessa altura, a propaganda e o imperialismo russos criaram uma falsa impressão das pessoas com raízes ucranianas.

Há uma outra dimensão deste problema: as pessoas que não conhecem as suas verdadeiras origens são mais susceptíveis de serem manipuladas. Por exemplo, os padres da Igreja Ortodoxa Russa na Ucrânia, nos territórios de língua primordialmente ucraniana, convencem facilmente os crentes de que os seus antepassados rezam em russo há séculos e que, por isso, a Rússia, e não a Ucrânia, se preocupa realmente com a sua vida espiritual.

Natalie Wood

A história da “desucranização” voluntária do apelido (ou, mais raramente, do nome próprio) não é nova. Por exemplo, quando se registavam nos Estados Unidos, os imigrantes ucranianos recém-chegados escolhiam variantes americanas para facilitar a sua assimilação natural. No entanto, se esta decisão os ajudou a se instalarem, poderia (e pode) tornar muito difícil para os seus contemporâneos ou futuros descendentes encontrarem laços familiares, uma vez que, por várias razões, os membros da família não mantiveram contacto.

Rick Danko

O canadiano Rick Danko ganhou fama na lendária banda de rock “The Band” que foi mais popular no final dos anos 60 e início dos anos 70. Na banda, era baixista, guitarrista rítmico e co-vocalista. Os avós paternos de Rick eram Joseph e Paraskeviya Danko. Os pais nasceram na Ucrânia e emigraram mais tarde para o Canadá.

Muitos canadianos ucranianos alcançaram sucesso em vários domínios (o Canadá tem uma das maiores diásporas de ucranianos). No entanto, muitos dos seus descendentes não divulgam as suas origens pelo que pode ser uma surpresa para os ucranianos o facto de artistas, atletas ou cientistas mundialmente famosos serem seus compatriotas.

Em meados da década de 1960, “The Band” ganhou reconhecimento como a banda de Bob Dylan e a sua digressão de 1966 ficou conhecida como o primeiro concerto elétrico de Dylan. Em 1968, lançaram o seu primeiro álbum, Music From Big Pink, como um grupo independente. Este disco tornou-os imediatamente populares. O próprio Bob Dylan é de ascendência ucraniana e judaica, e os avós paternos de Dylan, Anna Kirgiz e Sigman Zimmerman, emigraram de Odesa no início do século XX devido aos pogroms no Império Russo.

“The Band” combinava, na sua música, country, rock, folk, clássico, R&B, blues e soul. Entre as suas canções mais populares estão The Weight, The Night They Drove Old Dixie Down e Up on Cripple Creek. O crítico musical Bruce Eder descreveu-os como “uma das bandas de rock mais populares e influentes do mundo, a sua música levada tão a sério pelos críticos <…> como a música dos Beatles e dos Rolling Stones”. “The Band” foi introduzida no Canadian Music Hall of Fame em 1989 e no Rock and Roll Hall of Fame em 1994. Em 2004, a revista Rolling Stone classificou-os em 50º lugar na sua lista dos 100 maiores artistas de todos os tempos.

Tony Levin

Tony Levin, um dos maiores baixistas do nosso tempo (tocou com Pink Floyd, King Crimson, Yes; cantores Peter Gabriel, David Bowie, Paul Simon, John Lennon, Lou Reed, Tom Waits; em geral, participou na criação de mais de 500 álbuns de vários artistas), também tem raízes ucranianas. Numa conversa pessoal com Tony Levin após o seu concerto em Kyiv, em 2012, ele disse que vem frequentemente a Kyiv como turista para passear nas ruas.

Anteriormente, o músico publicou no seu sítio Web um relatório da sua viagem à Ucrânia:

— Os meus avós eram de Berdychiv (a 180 km a sudoeste de Kyiv – ed.) mas depois mudaram-se para uma pequena vila chamada Ostropil (actualmente a aldeia de Staryi Ostropil – ed.) a que a minha mãe chamou Ostropóliya e foi aí que ela nasceu.

Tony Levin fez uma viagem de propósito a esta aldeia, que, para falar, foi fundada como cidade pelo príncipe Kostiantyn Ostrozkyi em 1576, e depois, juntamente com o seu irmão Pete, escreveu uma canção dedicada à sua pequena terra natal. Este é um dos poucos casos em que, por interesse nas suas origens e respeito pelos seus antepassados, um estrangeiro vem a uma aldeia ucraniana para descobrir informações sobre os seus familiares por si próprio: visitam o cemitério da aldeia, onde, naturalmente, todas as inscrições estão em ucraniano, tentam comunicar com os habitantes locais, etc. Estas histórias são raras, mas provam, mais uma vez, que os ucranianos precisam de abordar muitas questões relacionadas com a preservação da memória nacional de uma forma abrangente, incluindo a preservação e digitalização de arquivos, a manutenção dos cemitérios, a criação de plataformas noutras línguas para facilitar a investigação genealógica aos estrangeiros, etc.

Melanie Safka

A cantora Melanie cujo nome verdadeiro é Melanie Safka (nascida em 1947) é uma famosa estrela dos anos 70, símbolo do festival de rock de Woodstock, vocalista, guitarrista, compositora e letrista. É conhecida como a primeira cantora de pop-rock a actuar nas mais famosas salas de música clássica: “Carnegie Hall”, “Metropolitan Opera” e Sydney Opera House. Foi a primeira artista pop a cantar em frente à Assembleia Geral da ONU. A cantora tornou-se popular com a sua canção Brand New Key (1971-72), uma versão cover de Ruby Tuesday dos Rolling Stones, canção Look What Have They Done to My Song, Ma, e o seu hit de 1970 Lay Down (Candles in the Rain).

Melanie Ann Safka nasceu a 3 de Fevereiro de 1947 em Nova Iorque, filha de pais imigrantes: o seu pai (ucraniano) era proprietário de uma cadeia de lojas de descontos e a sua mãe (italiana) era cantora de jazz. O marido e produtor da cantora, Peter Schekeryk, também é de ascendência ucraniana.

“Gostaria de cantar para os ucranianos”, disse ela em 1978. “O meu marido, Peter Schekeryk, nasceu na Ucrânia e canta canções ucranianas — são fantásticas.”

Michael Bolton, David Duchovny, Lenny Kravitz e Vera Farmiga: estrelas modernas com raízes ucranianas

O verdadeiro nome da super estrela pop dos anos 80, Michael Bolton (nascido em 1953), é Bolotin. No seu livro “The Soul of It All: My Music, My Life”, ele escreve:

— Se a minha voz vem das profundezas da minha história familiar, talvez um dos meus antepassados em Kyiv fosse um cantor na igreja, um dyak.

Bolton tornou-se conhecido pela sua série de baladas pop-rock no final da década de 1980. O cantor vendeu mais de 75 milhões de discos, gravou 8 álbuns que atingiram o top 10 da tabela da Billboard e dois singles que alcançaram o primeiro lugar da tabela. Ganhou também 6 American Music Awards e dois Grammy Awards.

O avô do actor americano David Duchovny (nascido em 1960) era Moishe Duchovny, um emigrante de Berdychiv que foi escritor e jornalista em Nova Iorque em 1918. A sua avó era uma emigrante polaca. Durante a Revolução da Dignidade (2014), David Duchovny tweetou que era ucraniano:

— Cresci a pensar que era russo, mas só agora me apercebi que sempre fui ucraniano. Nunca é demasiado tarde para mudar.

O actor tornou-se famoso graças à série “The X-Files” (ou “Ficheiros Secretos”) onde interpretou o agente do FBI Fox Mulder, e à série televisiva “Californication”. Ambos os papéis valeram-lhe um “Globo de Ouro”.

O famoso cantor Lenny Kravitz (nascido em 1964) disse durante a sua última visita a Kyiv, em 2008: “É bom voltar a casa”. É que o avô de Lenny era de Kyiv. Era um Ashkenazi ucraniano(Ashkenazi são judeus da Europa Central e do Leste) que se mudou para Nova Iorque, e o apelido Kravitz é uma versão americanizada do apelido ucraniano Kravets (alfaiate, literalmente).

O próprio Lenny mencionava repetidamente o seu envolvimento com a Ucrânia e, especialmente durante as entrevistas, sublinhava que o seu avô era da capital da Ucrânia. É por isso que o músico visitou Kyiv várias vezes sem o conhecimento dos meios de comunicação social, encontrando-se com investigadores da história dos judeus ucranianos, uma vez que isso também faz parte da sua identidade.

Lenny Kravitz foi classificado em 93º lugar, na lista dos “100 Maiores Artistas de Hard Rock” do canal de televisão por cabo americano VH1. Em 2011, foi nomeado oficial da Ordem das Artes e das Letras e desempenhou um papel na série de filmes “The Hunger Games”. Ao longo da sua carreira, Kravitz vendeu mais de 40 milhões de álbuns em todo o mundo.

A actriz americana Vera Farmiga (nascida em 1973) diz-se “cem por cento ucraniana” porque, apesar de ter nascido nos Estados Unidos, não falava inglês até aos seis anos de idade. Frequentou uma escola ucraniana em Nova Jersey, actuou com o grupo de dança “Syzokryli” e foi membro do Plast (escuteiros ucranianos).

Desde o início da invasão em grande escala, Vera tem apoiado a Ucrânia de todas as formas possíveis: recita poemas de poetas ucranianos, liga avisos de ataques aéreos nos seus concertos, para chamar a atenção dos americanos para a situação em que vivem os ucranianos, apela a dar armas e muito mais. Também planeia fazer uma visita.

Os filmes mais rentáveis/de maior bilheteria e mais aclamados pelos críticos de Vera Farmiga são “Down to the Bone” (2004), “The Manchurian Candidate” (2004), “The Departed” (2006), “Joshua” (2007), “The Boy in the Striped Pyjamas” (2008), “Up in the Air” (2009) e “Annabelle Comes Home” (2019). O seu papel mais famoso no filme “Up in the Air” (2009) valeu-lhe uma nomeação para o Óscar de Melhor Actriz Secundária, um Globo de Ouro de Melhor Actriz Secundária, um BAFTA (o equivalente britânico do Óscar) de Melhor Actriz Secundária e um prémio de Screen Actors Guild Award(SAG Awards). Pela sua estreia na realização, “Heaven and Earth” (2011), ganhou o Gotham Independent Film Award para “Realizador Revelação”.

Descendentes famosos de judeus ucranianos emigrantes

Talvez a maior contribuição para a cultura mundial tenha sido dada pelos descendentes de judeus ucranianos que emigraram para os Estados Unidos (a maioria deles de Odesa), devido às vagas de pogroms judaicos no Império Russo (finais do século XIX – início do século XX): o músico e poeta Bob Dylan, o realizador de cinema Steven Spielberg, o ilusionista David Copperfield, o maestro Leonard Bernstein, o compositor George Gershwin(Jacob Gershowitz), a cantora Amy Winehouse (nasceu e viveu no Reino Unido), os actores Sylvester Stallone, Dustin Hoffman, Leonard Nimoy e Liev Schreiber.

O multiculturalismo da Ucrânia e a contribuição das comunidades nacionais para a nossa existência comum são temas que os ucranianos só agora começam a compreender sistematicamente e a integrar numa identidade colectiva que, no entanto, é constituída por um número incomensurável de histórias das nossas famílias.